Índice
1. Introdução
A área com cerca de 799 380km², actualmente
correspondente ao território moçambicano, surge no contexto da ocupação colonial.
Foi por essas alturas que as potências europeias (movidas por razões de ordem
económica) promoveram nos finais do século XIX a Conferência de Berlim (1884 –
1885), na qual se materializou a partilha de África de forma arbitrária. Assim
afirmamos porque aquando da concretização dos seus interesses (que viriam a
terminar com a ocupação efectiva), os ocidentais não consideraram as fronteiras
culturais, etnolinguísticas, económicas, geográficas, políticas e/ou tradicionais
africanas, dividindo deste jeito diversas estruturas sociais.
É precisamente neste cenário que surge um Moçambique multilinguístico
e multiétnico, isto é, formado por povos que partilham línguas, hábitos e
costumes diferentes num mesmo espaço físico-geográfico. Mas apesar desta
partilha acontecer dentro da mesma fronteira, se por um lado, no que tange a
cultura, os diferentes grupos étnicos existentes no país comungam diversos
traços culturais, por outro, os traços culturais diferem-se.
Motivados pela necessidade de compreendermos o fenómeno
cultural moçambicano, o presente trabalho, que se insere no âmbito da
disciplina Literatura e Cultura
Moçambicana, cujo tema é Cultura Moçambicana: Aspectos Convergentes E Divergentes Da
Cultura Moçambicana Multiétnica E Multilinguística, visa analisar os
aspectos convergentes e divergentes da cultura moçambicana em “Quenguelequezê”,
poema de Rui de Noronha, “Balada de Amor Ao Vento” e “Niketche”, romances de
Paulina Chiziane. A primeira análise vai opor “Quenguelequezê” da “Balada de
Amor Ao Vento”, na qual mostraremos (i) como o rito de nascimento acontece em
cada texto e, em “Niketche”, (ii) como a instituição casamento é concebida em dois espaços
culturais diferentes, focando a atenção a reacção das mulheres perante este
fenómeno.
Portanto, o trabalho terá dois momentos essenciais: o
primeiro tem a ver com a busca dos principais conceitos relacionados com o tema
em estudo enquanto o segundo será destinado a análise propriamente dita.
Eis a estrutura do trabalho: Breves considerações sobre
as noções de Literatura, Cultura e multilinguismo; Alguns aspectos convergentes
e divergentes da cultura moçambicana, A celebração do ritual de nascimento em
“Quenguelequezê” e “Balada de Amor Ao Vento”; Como é que as mulheres do sul e do norte de Moçambique se portam antes e durante
o casamento?; Conclusão e Referência bibliográfica.
2. Breves
considerações sobre as noções de Literatura, Cultura e multilinguismo
2. 1. Noção de
Literatura
A intenção de encontrar um conceito referencial de
literatura, enquanto ciência, com métodos, objectos e objectivos próprios, é
marcada de contradições e repulsas ao longo da história literária. Pois, nem as
tentativas de definição biográfica de literatura de Saint Beuve, historicista
de Hippolyte Tain, formalista dos Formalistas Russos, institucional/funcional
defendida, por exemplo, por Stanley Fish, conseguiram vincar. Isto acontece
porque, no entender de Todorov (1978: 25), para além da utilização da linguagem
não existe nenhum elemento extensivo e exclusivo dos textos literários, o que
faz com o que se encontra em obras literárias possa também ser encontrado em
obras não literárias.
Por isso, neste estudo iremos nos preocupar com
literatura enquanto uma manifestação artística, um texto verbal com lacunas que
devem ser preenchidas pelo leitor para que possam fazer algum sentido.
2. 2. Noção de Cultura
De acordo com Siliya (1996: 33), “o homem cria cultura no
seu relacionamento permanente com a natureza” − esta ideia também nos é
sugerida por Martins (2001).
Para Siliya e Martins a cultura parece ser um produto
natural, no entanto, sem o ambiente social circundante ao homem, ainda que haja
um relacionamento entre este e a natureza, entendemos nós, não pode haver
cultura.
Como se a ampliar aquela noção, Lima,
Martinez e Filho (1991), definem cultura como tudo o que recebemos,
transmitimos ou inventamos. Por exemplo, uma adivinha, um conto, o respeito
pelos mais velhos, as regras, os hábitos/costumes, a língua, e etc., constituem
cultura. Daí afirmarem: para além de cultura ser o conjunto de tradições e
herança social, é tudo que o homem acrescenta à natureza humana.
Esta noção dual, que realça o factor natural e social do
Homem, leva-nos ao seguinte posicionamento: a cultura é um conjunto de
artefactos materiais e psicológicos que o Homem (re)produz, transmite e
inventa, no meio social, como forma de vencer as suas necessidades e/ou as suas
limitações biológicas/físicas.
2. 3. Noção de Multilinguismo
Dubois e tal (1978: 470), usam a noção multilinguismo
como sinónimo de plurilingue. Assim, de acordo com aqueles autores, multilingue
refere-se aquele falante plurilingue. Melhor dizendo, “diz-se que um falante é
plurilingue quando utiliza no seio de uma mesma comunidade várias línguas conforme
o tipo de comunicação (em sua família, em suas relações sociais, em suas
relações com a administração, etc.). Diz-se de uma comunidade que ela é
plurilingue quando várias línguas são utilizadas nos diversos tipos de
comunicação”. Logo, multiétnico refere-se a uma sociedade composta por várias
etnias[1].
Como é o caso de Moçambique
3. Alguns
aspectos convergentes e divergentes da cultura moçambicana
Numa intervenção concedida ao IV Encontro de Professores
de Literaturas Africanas, está evidente que Lourenço do Rosário defende que a
literatura moçambicana tem um lugar, enquanto veículo de valores culturais,
quer dizer, a literatura é um espaço de debate, de questionamento e de reflexão
dos hábitos e de costumes tradicionais. Porque cremos na veracidade dos
argumentos de Rosário (2010), trataremos dos aspectos convergentes e
divergentes da cultura moçambicana tendo como foco três textos literários da
literatura moçambicana: “Quenguelequezê”,
poema de Rui de Noronha, “Balada de Amor Ao Vento” e “Niketche”, ambos os romances
de Paulina Chiziane, uma vez que parecem apresentar elementos elucidativos
sobre a diversidade multilinguística e multiétnica da cultura moçambicana.
3. 1. A
celebração do ritual de nascimento em “Quenguelequezê”[2] e
“Balada de Amor Ao Vento”
Um dos vários aspectos de convergência entre os diversos
grupos etnolinguísticos existentes em Moçambique é a prática dos rituais em
determinados estágios de evolução física e mental do ser humano. Referimo-nos
aos seguintes rituais: nascimento, iniciação, matrimónio ou fúnebre. Não obstante, embora os rituais mencionados
façam parte – podemos assumir – de todas as etnias do país, a maneira como cada
comunidade ou grupo levará a cabo é diferente. A seguir, revelaremos as
semelhanças e as diferenças concernentes ao rito de nascimento, nos textos já
identificados.
No poema de Rui de Noronha, “Quenguelequezê”[3], o sujeito de enunciação apresenta-nos um “cenário” em que se
concretiza o ritual de nascimento. Neste poema, o ritual é levado a cabo entre cânticos
e danças e, “Como se fora em brando e afogado leito/ Deitaram a criança,
rebolando-a,/ Em cima do monturo”, sendo que no auge da cerimónia a criança é
apresentada à lua longe dos cuidados paternos. Aliás, porque o ritual de
nascimento tem uma extrema importância simbólica na vida dos que nele acreditam
e praticam, pois é graças a este ritual que (de acordo com o texto, só pode ser
orientado pela mulher mais idosa da comunidade) já adulto, a criança pode ser
perspicaz, intrépido, inteligente e forte. Por isso, o pai da criança só
regozija depois de cumprido integralmente o ritual porque assim antevê um
futuro brilhante para o filho e, consequentemente, para si próprio, através da
personalidade do filho. As seguintes passagens extraídas de “Quenguelequezê”
quando o pai tem finalmente o contacto com filho, são ilustrativas, vejamos:
“Meu filho, eu estou contente!
Agora já não temo que ninguém
Mofe de ti na rua,
E diga, quando errares, que tua mãe
Te não mostrou à lua!
Agora tens abertos
os ouvidos
Para tudo
compreender;
Teu peito afoitará, impávido, os rugidos
Das feras, sem tremer…
Meu filho, eu estou contente!
Tu és agora um ser
inteligente,
E assim hás-de crescer, hás-de ser
homem forte
Até que já cansado
Um dia muito velho
De filhos rodeado,
Sentindo já a dobrar-se o teu joelho
Virá buscar-te a morte…
Meu filho, eu estou contente!
Agora, sim, sou
pai!...”[4]
Como podemos notar, na passagem acima há uma entidade
textual que se jubila com o nascimento do filho não revela, antes pelo
contrário, enfatiza orgulhoso no último verso que é pai porque um acontecimento
importante materializou-se com sucesso. Parafraseando, a entidade textual
sente-se pai no momento em que o filho passa por todo o ritual de nascimento e
não quando nasce, pois, sem apresentação da criança à lua, repetimos, pela senhora
mais idosa da comunidade, de nada vale a vida.
Há aqui um simbolismo cultural intenso que comprova que a
literatura realmente é um espaço de debate, de questionamento, de reflexão dos
costumes tradicionais/culturais de uma sociedade, mas também de aprendizagem e
conservação indubitável desses costumes.
O indivíduo do grupo etnolinguístico ronga que for a ler “Quenguelequezê”
pode, sem receio algum, identificar-se com o ritual e com a forma como
aparentemente esse ritual é desenvolvido. É o nosso caso. Por isso (re)vivemos
a passagem “Olha é tua” (p. 27) como se a lua do poema também nos pertencesse.
Em relação à “Balada de Amor ao Vento”, primeiro romance
de Paulina Chiziane, o qual gira em torno da estória amorosa de Sarnau e
Mwando, personagens que depois de se separarem diversas vezes veriam a terminar
juntos nos “labirintos” de Mafalala, o rito de nascimento também é um
acontecimento a ter em conta. Sem nos centrarmos no universo diegético em si,
mas na passagem em que constatamos o ritual de nascimento, capítulo 11, explicaremos
como acontece.
Logo a partida, no capítulo 11 do romance em causa está
evidente a celebração do ritual do nascimento. À semelhança do que acontece no
poema acima analisado, o ritual nesse romance também inicia de forma especial
“Kenguelekezêêê!...” que se ao nível semântico converge com o outro texto, ao
nível da ortografia diverge.
Em a “Balada de Amor ao vento” o ritual de nascimento que
devia se realizar durante a lua nova, realiza-se na lua cheia por se tratar do
filho do rei, e a apresentação do recém-nascido à lua é motivado pelo facto de
se pretender livrá-lo de diarreias, doenças nervosas e ataques durante o longo
período de vida em que a criança estará sujeita às diversas metamorfoses. Este
ritual é orientado pelas madrinhas da criança à volta de uma fogueira sagrada,
na qual, para além da apresentação da criança à lua, dançando, administram
fumos e drogas com o objectivo de afugentar feitiços e maus-olhados. Neste
processo, não se escusam as vacinas, amuletos e colares de pele de leão, de
modo que futuramente o miúdo possa ser corajoso e determinado como o leão é. Há
por detrás destas todas peripécias uma crença na qual os tsongas (Marrongas,
machanganas e matwas) se espelham na construção de um futuro individual e, consequentemente,
colectivo na medida em que não deve haver indivíduo sem colectivo – porque o
Homem é por essência um ser gregário, já o sabemos – e colectivo sem indivíduo.
Mas o que há de comum entre estes dois textos no concerne ao rito de nascimento
e como é que as divergências se explicam à luz de uma sociedade multiétnica e
multilinguística?
Começando por responder a primeira pergunta, em ambos os
textos quando a criança nasce celebra-se o rito de nascimento que consiste em o
recém-nascido ser apresentado à lua de modo que a sua vida possa ser o que a
comunidade almeja a qualquer membro que nela integra; em ambos os textos o
ritual é dirigido por mulher(s) e os homens, inclusive o pai da criança,
mantém-se distante da criança até que se cumpra integralmente o ritual; em
ambos os textos o termo “Quenguelequezê” (Rui de Noronha) ou “Kenguelekezêêê
(Paulina Chiziane) mais do que anunciar a lua nova, pretendem abrir as portas
da vida ao recém-nascido; em ambos os textos o ritual é realizado entre danças e
cânticos e à noite.
Ora, se em Noronha o ritual é celebrado pela mulher mais
idosa da comunidade, em Chiziane desvaloriza-se a idade, são as madrinhas da
criança que orientam o ritual. Para além da variedade ortográfica do termo,
como já referimos, enquanto no primeiro texto o homem tem um papel secundário
de cantar, no segundo o homem nem esse papel tem. Outra diferença está
relacionado com facto de depois de a criança ser ostentada à lua, em “Balada de
Amor ao Vento”, passar por um processo de vacinação e aquisição de amuletos e
peles de leão com o objectivo de torná-la forte e corajosa − em “Quenguelequezê”
tal fenómeno não é aparente.
Estas divergências acontecem porque, na nossa óptica, cada
texto apropria-se de um universo de um determinado grupo etnolinguístico e
étnico que mesmo sendo tsonga, nos dois casos, as diferenças linguísticas e
tradicionais vão variar de acordo com o cronótipo que separa os dois grupos etnolinguísticos
implicitamente identificados tanto em “Quenguelequezê” como em a “Balada de
Amor ao Vento”. É pela diversidade linguística e étnica que o Moçambique possui
que os textos literários, a dada altura, enquanto um produto que se não
dissocia na cultura, apresentam aspectos convergentes e divergentes. Todavia,
buscar dois textos literários não constitui a única forma de demonstrar estes
aspectos. Num mesmo texto literário podem se encontrar vários elementos
intrínsecos à diversidade cultural. Niketche, que a seguir analisaremos, é um
exemplo a ter em conta.
3. 2. Como é que as mulheres do sul e do norte de Moçambique se portam antes
e durante o casamento?
Lançamos esta pergunta em jeito de provocação. Se
quiséssemos respondê-la, com efeito, à luz da realidade moçambicanidade, teríamos
de fazer um estudo sociológico em vez de literário. O nosso interesse não é
esse, mas sim, como fizemos menção na introdução deste trabalho, analisar os
aspectos convergentes e divergentes da cultura moçambicana a partir de textos
literários previamente mencionados. Para o efeito, neste ponto iremos nos
focalizar nas falas de duas personagens de Niketche, pois oferecem-nos
argumentos passíveis de responder a pergunta acima.
O romance Niketche gira em torno dos melodramas que Rami,
a protagonista da estória, vive quando Tony, o marido, relaciona-se com outras
mulheres, repelindo-a a um plano secundário. Com o receio de perder o marido,
Rami resolve dirigir-se a uma macua idónea no intuito de obter conselhos que a
ajudassem a salvar o lar. É no diálogo destas duas mulheres que se registam
algumas semelhanças e diferenças entre as mulheres do sul e do norte, e tudo
surge da necessidade de Rami, representado metaforicamente as mulheres do sul,
responder a pergunta feita por aquela que, também metaforicamente, representa
as mulheres do norte, “Como foi a preparação do teu casamento?”. Respondendo a
pergunta, Rami revela que as mulheres do sul, em vésperas de casamento, para
além dos conselhos ligados à obediência e à maternidade que recebem da igreja e
da família, nada mais aprendem nos dias que precedem o casamento. Por isso, a
conselheira macua que Rami procura afirma à luz dos seus costumes: “Então não
és mulher” – e diz mais – “És ainda criança. Como queres tu ser feliz no
casamento, se a vida a dois é feita de amor e sexo e nada te ensinaram sobre a
matéria?” Neste contexto, a menção aos ritos de passagem de adolescência para a
juventude e de noiva para a esposa aparecem como factos distintivos entre as
mulheres das duas regiões.
Outras diferenças existentes entre as mulheres do sul e
do norte como uma construção social encontramos ao longo da narração. Citamos:
“No norte, as mulheres enfeitam-se com flores, embelezam-se, cuidam-se. No
norte a mulher é luz e deve dar luz ao mundo” (p. 38). Mais adiante a narradora
continua: no sul as mulheres vestem cores tristes, pesadas. Têm o rosto sempre
zangado e cansado, e falam aos gritos como quem briga, imitando os estrondos da
trovoada. Usam o lenço na cabeça sem arte nem beleza, como quem amarra um feixe
de lenha. Vestem-se porque não podem andar nuas” (p. 38). Todas estas
diferenças acentuadas entre as mulheres do sul e norte, de acordo com a
conselheira macua, e que concorrem para que Rami não consiga gerir o seu lar,
expondo-se a praticar um papel no lar que em vez de a favorecer, só a pode
prejudicar, deve-se a falta dos ritos de passagem, instituição em que as
mulheres do norte aprendem coisas relacionados ao amor, sedução, de maternidade,
da sociedade, de convivência e acima de tudo as lições básicas de amor e sexo.
Mas não só existem diferenças entre as mulheres das duas
regiões. Aliás, há diferenças porque existem semelhanças. As mais flagrantes
que o romance oferece são:
Ø
De
norte a sul os diferentes grupos etnolinguísticos, através de tabus, impendem
que a mulher em período de menstruação aproxime-se da vida pública;
Ø
De
norte a sul as mulheres deparam-se com tabus que as impedem de comer ovos com o
pretexto de que terão filhos carecas e se portaram como galinhas poedeiras no
momento do parto;
Ø
De
norte a sul as mulheres são obrigadas a aceitar os mitos que as aproximam do
trabalho do doméstico e afastam os homens;
Ø
Do
norte a sul as mulheres são obrigadas a servir aos maridos os melhores nacos da
carne, ficando para elas os ossos, as patas, as asas e o pescoço;
Ø
Do
norte ao sul as mulheres são culpadas pelas calamidades naturais e outras
intempéries.
Portanto, a forma como a mulher do norte e do sul prepara
e vive o casamento é diferente, pois os hábitos e costumes que as orientam
também são diferentes. Assim, pode-se afirmar que a diversidade étnica, que
também se pode expressar a partir da diversidade linguística, é um factor que
gera distinções culturais.
Para terminarmos, queremos dizer o seguinte: “as culturas
são fronteiras invisíveis construindo a fortaleza do mundo” (p. 41).
4. Conclusão
Numa sociedade multi-etnolinguística como Moçambique, a
diversidade cultural é um fenómeno social irredutível. Para que se perceba a
cultura moçambicana, antes é necessário que se consolide os aspectos
concorrentes à convergência e a divergência de cada grupo etnolinguístico. Na
impossibilidade de fazê-lo, neste trabalho nos dedicamos a analisar alguns
aspectos que amiúde permitem relacionar determinados hábitos e costumes,
através da literatura, por entendermos que é uma manifestação artística propensa
a reflexão da cultura. E a conclusão a que chegamos é de que não existem
fronteiras políticas ou geográficas que podem fazer com que as manifestações
culturais de um país ou parte dele sejam as mesmas/diferentes.
Porque a cultura não é um património estanque, pelo
contrário, por evoluir num determinado cronótipo, os hábitos e costumes
desenvolvidos pelo Homem num determinado universo, tanto podem concorrer para
aproximar uma etnia da outra como também para afastá-las. E mesmo numa mesma
etnia, a uniformidade dos costumes não é fenómeno que se pode encontrar com
muita facilidade, pois o Homem em si já é uma entidade diversa.
Tanto em “Quenguelequezê”, de Rui de Noronha, “Balada de
Amor ao Vento” e “Niketche”, ambos de Paulina Chiziane, a cultura integra na
essência dos textos como se pretendessem dar-se a conhecer aos leitores. Tal
facto acontece porque a literatura está “umbilicalmente” ligada a cultura, e,
por isso, funcionar como um veículo de transmissão e preservação dos costumes
sociais. Há, portanto, uma relação recíproca entre a literatura e cultura e o
Homem que as produz na tentativa de perpetuar imagens e imaginários que sirvam
de itinerários às diversas gerações.
5. Referência
bibliográfica
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(1985) Cultura Tradicional Banto.
Luanda: Secretariado Arquidiocesano de Pastoral.
Chiziane, P. (2008)
Balada de Amor ao Vento, 4ª Edição. Maputo: Ndjira.
Dubois, J. et
al (1973) Dicionário de Linguística.
São Paulo: Editora Cultrix.
Lima, M.,
Martinez, B. e Filho, J. (1991) Introdução
à Antropologia Cultural, 9ª Edição. Lisboa: Editorial Presença.
Lopes, A.,
Sitoe, S. e Nhamuende, P. (2002) Moçambicanismos:
Para um Léxico de Usos do Português Moçambicano. Maputo: Livraria
Universitária.
Matusse, G. (1998) A Construção da
Imagem de Moçambicanidade em José Craveirinha, Mia Couto e Ungulani Ba Ka Khosa.
Maputo: Livraria Universitária.
Mendes, O.
(1980) Sobre Literatura Moçambicana. Maputo: Instituto Nacional do Livro e do
Disco.
Noronha, E.
(2006) África Surge et Ambula: Rui de
Noronha – Poeta Moçambicano. Maputo: Espaço
Rui de Noronha Associação.
Rosário, L. (2010) O
Lugar da Literatura Como Veículo de Valores Culturais Africanos – O Caso de
Moçambique. IV de Professores de Literaturas Africanas. Belo Horizonte,
Novembro de 2010.
Siliya, C. (1996) Ensaios
Sobre a Cultura Em Moçambique. Maputo: ____________________
Todorov, T. (1978) Os
Géneros do Discurso. Lisboa: Edições 70.
Outra
fonte
Martins, D. (2001) O Estado Natural
de Thomas Hobbes e a Necessidade de uma Instituição Política e Jurídica,
site [acessed on Março de 2011].
[1] Grupo humano que apresenta
características raciais, culturais e nacionais homogéneas (p.456).
[2] “Termo anunciador do aparecimento da
lua nova no firmamento, ocasião em que se realizavam cerimónia de apresentação
dos recém-nascidos (termo consagrado também na literatura por Rui de Noronha)
como forma de lhes abrir as portas da vida. Significa ei-la (a lua)! O termo
expressa o momento que se esperava com ansiedade e sem se saber exactamente
quando aconteceria; sinal especial de esperança. Tradição entre marrongas,
machanganes e matswas. Formal e informal” (Lopes, Sitoe e Nhamuende, 2002:
128).
[3] In Mendes (1980: 25 – 28).
[4] Sublinhados nossos.